RESOLUÇÃO CFFa  Nº 770, DE 29 DE MARÇO DE 2025

Dispõe sobre a regulamentação da atuação do fonoaudiólogo em saúde mental  na perspectiva da atenção psicossocial.

 

O Conselho Federal de Fonoaudiologia, no uso de suas atribuições legais e regimentais, na forma da Lei n.º 6.965, de 9 de dezembro de 1981, regulamentada pelo Decreto Federal nº 87.218, de 31 de maio de 1982;

Considerando a decisão do Plenário do Conselho Federal de Fonoaudiologia, durante a 102ª Sessão Plenária Extraordinária, realizada no dia 29 de março de 2025.

RESOLVE:

Art. 1º Regulamentar a atuação do fonoaudiólogo reconhecendo suas habilidades e competências para atuar em saúde mental na perspectiva da atenção psicossocial e do cuidado em liberdade com base comunitária e territorial.

PARÁGRAFO ÚNICO. A Reforma Psiquiátrica e os direitos humanos são uma prerrogativa para essa atuação considerando a linguagem e a comunicação permeadas por todas as áreas de competência da Fonoaudiologia.

Art. 2º O fonoaudiólogo, considerando suas atribuições, é o profissional que atua na linguagem e na comunicação humana, o que inclui os impactos decorrentes das  situações que produzem sofrimento mental, podendo compor de forma diferenciada as equipes interprofissionais que atuam no campo da saúde mental.

PARÁGRAFO ÚNICO. O desenvolvimento de habilidades de comunicação como estratégias potentes de intervenção, configuram uma das formas de tratamento não medicamentoso, frente aos efeitos do sofrimento mental, do leve aos mais graves e complexos.

Art 3º A atuação dos profissionais de Fonoaudiologia em saúde mental assume a ética do cuidado integral em equipe sob diferentes perspectivas de promoção de saúde, de prevenção de agravos, de reabilitação e estabilização dos quadros de sofrimento mental, com práticas humanizadas, específicas e/ou ampliadas, em todos os níveis de atenção no Sistema Único de Saúde - SUS, saúde suplementar e privada.

PARÁGRAFO ÚNICO. O fonoaudiólogo que atua em saúde mental desenvolve sua prática de forma abrangente, em todos os ciclos de vida, condições de sofrimento, na presença ou não de patologias definidas, levando em conta as singularidades, os territórios de circulação social e o cuidado integral com sujeitos e suas famílias ou responsáveis;

Art 4º O núcleo da atuação do fonoaudiólogo em saúde mental é o trabalho com a linguagem transversalizada por características singulares visando a compreensão dos símbolos linguísticos e expressão das emoções, desejos e pensamentos.

PARÁGRAFO ÚNICO. O objetivo central é o fortalecimento de laços, por meio da articulação e mediação de diálogos e construção de espaços de comunicação para o protagonismo dos sujeitos, familiares, comunidades e equipes nas experiências de interação para a inclusão, vida autônoma e independente em sociedade.

Art 5º O fonoaudiólogo que atua em saúde mental tem como propósito colocar o seu conhecimento e suas práticas a serviço dos processos da comunicação que permite aos sujeitos a manifestação das emoções, desejos e pensamentos, auxiliando a minimizar o sofrimento, a produzir autonomia, pertencimento e participação social, privilegiando as mais diversas formas de expressão para estar no mundo, devendo:

I. Explorar o potencial de recursos metodológicos, estratégias, ferramentas e dispositivos de intervenção para mediação das interações comunicativas verbais e não verbais; nas suas funções técnicas dentro e fora dos serviços, promovendo convivência e circulação dos sujeitos e seus pares, bem como, construindo e acompanhando uma rede de cuidados com garantia de direitos em consonância com os projetos terapêuticos.

II. Contribuir com sua expertise nos diagnósticos diferenciais, elaboração e execução de projetos terapêuticos singulares, com atuação integrada e transversalizada nos processos de cuidado, a serem construídos em equipe e com uma rede intersetorial, com olhar ampliado sobre a interdependência entre corpo, psiquismo e determinantes sociais nos sintomas relacionados aos processos de comunicação, abrangendo linguagem oral e escrita, bem como, audição e equilíbrio, voz, fala e motricidade orofacial.

III. Atentar nos processos de avaliação, para a transitoriedade dos quadros em saúde mental, de modo a não corroborar lógicas patologizantes, medicalizantes e capacitistas da sociedade; 

IV. Participar de forma autônoma e compartilhada, com as equipes multiprofissionais, de todas as ações e dispositivos de cuidado com embasamento científico e previstas nas diretrizes para a Saúde Mental, envolvendo:

 

a) escuta e acolhimento;

b) atendimento individual;

c) atendimento em grupo;

d) atendimento às famílias;

e) oficinas terapêuticas;

f)  visitas e atendimentos domiciliares;

g) atendimento às pessoas em situações de rua;

h) articulação de redes intra e intersetoriais como assistência social, educação, justiça, cultura, esportes e lazer, trabalho, habitação, entre outros;

i)  atividades comunitárias com foco na integração social do usuário e da família;

j)  práticas expressivas e comunicativas;

k) práticas de matriciamento;

l) ações de redução de danos;

m) promoção de contratualidade no território;

n) atenção e manejo às situações de crise;

o) ações de desinstitucionalização;

p) iniciativas de geração de trabalho e renda, empreendimentos solidários e cooperativas sociais;

r) ações de reabilitação psicossocial;

s) práticas integrativas;

t) e outras práticas orientadas pela atenção psicossocial, respeitando as competências exclusivas de outras áreas de conhecimento.

Art.6º O fonoaudiólogo da Saúde Mental poderá atuar em todos os equipamentos da Rede de Atenção Psicossocial obedecendo os objetivos específicos de cada serviço no âmbito do SUS e da rede suplementar e privada:

a) Centro de Atenção Psicossocial, Centro de Atenção Psicossocial Infanto-Juvenil, Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Outras Drogas, nas modalidades I, II, III e IV;

b) Serviços de Residência Terapêutica;

c) Unidades de Acolhimento Adulto e Infantojuvenil;

d) Centros de Convivência;

e)  Atenção Básica de Saúde incluindo Unidade Básica de Saúde - UBS, núcleos de apoio, Equipes Multiprofissionais na Atenção Primária à Saúde - eMulti, consultório de rua;

f)  unidades de urgência e emergência;

g)  enfermarias hospitalares especializadas, ao nível de internação e semi-internação;

h)  hospitais-dia;

i) ambulatórios gerais e de especialidades;

j) outros equipamentos  que venham a ser constituídos. 

PARÁGRAFO ÚNICO. Em serviços específicos, como os Centros de Atenção Psicossocial, a atuação do fonoaudiólogo está atrelada a casos absorvidos integralmente para o cuidado psicossocial em projetos terapêuticos, de modo que não ocorra a ambulatorização direcionada exclusivamente para assistência na especialidade.

Art 7º A formação do fonoaudiólogo para atuar em saúde mental inclui conhecimentos que sustentem sua prática e subsidiem a escolha da linha teórica a ser adotada, com autonomia, de forma transversal às demais áreas, numa relação de alteridade com outras disciplinas envolvendo aspectos da constituição subjetiva, psicodinâmica das relações, além dos processos mentais que envolvem a compreensão e expressão, devendo:

I. Abranger conhecimentos em saúde coletiva, políticas públicas, diretrizes técnicas e linhas de cuidado com perspectiva interdisciplinar sobre desenvolvimento humano, psicopatologia, psicofarmacologia, redução de danos, atuação em grupos, atuação com famílias, manejo de crises, atuação interprofissional e intersetorial em interface com as competências específicas do fonoaudiólogo.

II. Contar com capacitação contínua que inclua disciplinas teóricas, práticas e estágios, projetos de extensão e pesquisa desde a graduação e, por meio de programas de pós-graduação como especialização, residências em saúde mental e multiprofissionais, cursos de mestrado e doutorado e demais formações e aprimoramentos.

Art. 8º É também atribuição do fonoaudiólogo no campo da saúde mental exercer gestão de Serviços, coordenação e interlocução de territórios,  apoio de rede, formação e desenvolvimento de equipes e supervisão clínico-institucional em todos os âmbitos, com competência para potencializar diálogos e criar pontes de comunicação efetiva e produtora de saúde mental também entre os profissionais.

Art. 9º Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação no Diário Oficial da União - DOU.

 

 

Andréa Cintra Lopes

Presidente

 

 

Neyla Arroyo Lara Mourão

Diretora-Secretária

 

Publicado no DOU do dia 01/04/2025